A coragem de assumir a “diferença”

Tereza Lamy


Recentemente uma figura pública, Mulher, Política e Secretária de Estado veio a público assumir numa entrevista, a sua orientação sexual, pertencendo a uma minoria homossexual. Este facto ainda é notícia? Questionam-se muitos. Julgo que sim.


Partilhei esta entrevista na minha página de facebook, segui algumas páginas que fizeram o mesmo e assisti a alguns comentários de pessoas, que “não” se dizendo homofóbicos, diziam não ser relevante uma Secretária de Estado ou outra figura pública da Politica assumir a sua homossexualidade na praça pública. Que é um assunto íntimo e pessoal.

Já escrevi sobre intimidade algumas vezes. E sobre orientação sexual também. Intimidade é um mundo complexo que cada ser humano vive sozinho e com as pessoas que escolhe para a sua vida. Desse mundo fazem parte a personalidade, a sexualidade, os afectos, os sentidos, a maneira como vivemos o nosso eu, no fundo. 
Faz sentido partilhar alguns momentos desse nosso mundo com os outros? Faz, quando o fazemos em consciência e em verdade, sem ostentação, apenas porque ainda vivemos numa sociedade cheia de preconceitos e maldade. Ainda existe no coração dos homens o medo, o ódio, e todos os sentimentos que dai advém e têm de continuar a ser combatidos – a homofobia, o racismo, o machismo a xenofobia.

A orientação sexual de cada um de nós faz parte não só da nossa vida íntima, mas também da nossa mais profunda individualidade e identidade pessoal. E o que temos nós a ver com a identidade dos outros? Nada, ou tudo? Não nos relacionamos uns com os outros através da nossa identidade e personalidade?

E qual a relevância de figuras públicas respeitadas na sua área de trabalho assumirem a sua homossexualidade que faz parte da sua vida intima? Toda a relevância, porque uma pessoa heterossexual nunca precisou de assumir a sua orientação sexual perante os outros para ser respeitado.
Para quem é e sempre soube ser heterossexual, relacionou-se amorosa e sexualmente com pessoas do sexo oposto, nunca lhe foi exigido que explicasse por que razão assim conduzia a sua vida. Porque os heterossexuais nunca foram perseguidos, humilhados, troçados, considerados doentes mentais, espancados ou mortos por causa da sua orientação sexual.

Os seres humanos serem diferentes uns dos outros na sua intimidade não os desresponsabiliza dos seus deveres sociais e profissionais. Apenas nos mostra que a diversidade humana é aceite e liberta-nos de tabus e preconceitos limitativos.

Como professora, quero poder explicar aos meus jovens alunos e aos seus pais que não é necessário exibir a sua intimidade sexual, mas já não é preciso esconde-la, nem viver em segredo e em sofrimento uma vida inteira.

Como professora, quero sossegar os meus alunos que cada vez mais cedo começam a assumir a sua orientação sexual. Quero ser possível passar a mensagem aos seus pais de que os filhos não são “anormais”, nem vão ser infelizes, nem é uma tragédia que caiu na família. 
Quero poder mostrar aos meus jovens alunos que a sua orientação sexual, fazendo parte da sua personalidade, não vai ser limitativa de tudo o que poderão fazer na vida – Escolher a profissão que quiserem, constituir família, apaixonar-se, ter amigos e viver em sociedade sem medo nem perseguidos por estigmas, ameaça ou troça alheias.

Mas, como professora, quero poder alertar os meus jovens alunos que irão encontrar preconceito e incompreensão por parte de muitos. E explicar-lhes que a incompreensão vem do medo dos outros.

Viver em liberdade é viver sem Medo. Assumir quem se é requer coragem. E é com a coragem que se escreve a História e a Liberdade.


imagem de 
CHRISTIAN SCHLOE

Comentários

Enviar um comentário