A “Traição” na Relação Amorosa

Já aconteceu a quase todos ou todas. Ser “traído” pelo parceiro ou “trair”.


Este não é um tema fácil. Se não nos aconteceu, temos uma amiga ou uma amiga de uma amiga a quem aconteceu.

Estamos no mundo difícil dos conceitos de “fidelidade”, “lealdade” “confiança”, “verdade” ou “mentira”.

Quando um dos membros do casal descobre que o outro tem uma relação extraconjugal, surgem uma mistura de sentimentos que vão evoluindo à medida que o conhecimento também se vai tornando mais consciente e que a situação se torna mais “real”, passando de uma suspeita por vezes, até ao conhecimento de um facto comprovado.

Tomar conhecimento que o parceiro ou parceira tem uma relação Intima com uma outra pessoa desperta sentimentos, primeiro de espanto, como se um vendaval abanasse a nossa casa, depois vem a dor, imensa. Dor tão forte, porque não é uma dor simples, como uma perda, ou uma partida.

É uma mistura de sentimentos. Primeiro o ciúme, que é o sentimento mais destruidor que podemos sentir. Verde, chamam-lhe os poetas, o ciúme pega-se a todas as células do nosso corpo e mente e não nos larga.

 De repente, a casa que abanou com o vendaval cai de rajada em cima de nós. Tomamos consciência de que a pessoa com quem éramos um “casal” em quem confiávamos como se fosse a outra metade de nós, encontrou outra pessoa que tomou o nosso lugar.

O ciúme destrói por dentro, corrói qualquer atitude mais racional, torna qualquer pessoa calma, num animal selvagem, sem direcção a seguir. Quem já sentiu ciúme, sabe que seriamos capazes de fazer por ciúme loucuras que nunca seriamos capazes de fazer por amor.

Depois, acompanhando a irracionalidade dolorosa do ciúme, vem o sentimento de rejeição, de abandono. Convencemo-nos que há neste mundo, outra pessoa melhor que nós, e que conseguiu ganhar o afecto e o amor do nosso ou nossa companheira. Este sentimento de rejeição, já não é um vulcão como o ciúme. É devastador, como um tsunami. Temos a sensação que não saímos dali vivos. Ataca-nos o que temos de mais preciso – a auto-estima.

Finalmente, sobrevivendo ao vulcão e ao tsunami, atiramos com o pior cataclismo que nos lembramos – um meteorito sobre os dois, ou seja A Vingança.

E elaboramos planos e mais planos para que este meteorito faça os maiores estragos possíveis, mas continuamos a sofrer, porque o ciúme, a sensação de rejeição, de abandono, de deslealdade, de traição, não desaparece com o meteorito, todos estes sentimentos acabam por ser alimentados pelo desejo de vingança.

Não fazer nada? Não me parece que seja a solução. Fazer de conta de que não se sabe de nada? Também não.
Tomar atitudes? É capaz de ser o melhor. Não sofrer? É impossível. Dialogar para tentar perceber o que aconteceu no decorrer de um relacionamento? Parece razoável. Esconder o sofrimento e a desilusão? Também acho impossível. Ser honesto finalmente? É capaz de resultar antes do meteorito final.

Todos nós conhecemos casais que passaram por esta situação. Alguns, separaram-se em maior ou menor dor, em maior ou menor capacidade racional de ultrapassar a dor, outros superaram a situação e continuaram juntos.

Claro que não há quem diga de fora, “ai se fosse eu… Não perdoava, ou ai se fosse eu… tinha feito isto ou aquilo”… Mas cada um sabe de si e cada vida é uma vida e cada um vive a sua como quer e pode. E faz muito bem.

Uma conhecida sexóloga americana, especializada em terapia de casal  chamada Esther Perel, (aconselho a leitura do seu livro “Amor e Desejo na Relação Conjugal”), tem a teoria de que uma relação extraconjugal tem a ver como a forma como o elemento do casal que comete a “deslealdade” se vê dentro do casamento.

 Explica ela que não é tanto a paixão que a pessoa que tem um “caso” sente pela terceira pessoa, mas sim o desencanto que sente dentro do casal em que está. Diz ainda que, como terapeuta de casal, nunca aconselharia um relacionamento extra conjugal para salvar um casamento, mas que na sua experiência conheceu muitos casais que sobreviveram a um caso destes e perceberam onde tinham falhado, tornando a sua relação mais forte.

E que essa terceira pessoa o/a vê como os olhos de encantamento como a/o sua/seu companheira ou companheiro o via quando se apaixonaram no inicio do relacionamento. Essa terceira pessoa é  um espelho do seu passado em que ele ou ela se vê jovem outra vez, mas principalmente gosta de imagem que essa pessoa lhe devolve, ou seja gosta de si próprio/a quando está com ela/ele, porque já não gosta de si próprio quando está no seu relacionamento actual.

Por isso ela recomenda que antes que aconteça o vulcão, o tsunami e o cataclismo final, que os casais arranjem momentos privilegiados de intimidade e se voltem a olhar como se fosse a primeira vez, recriando esses momentos primeiros em que se apaixonaram um pelo outro, devolvendo como num espelho ao outro a pessoa que ele era e por que se apaixonaram.

Deixo-vos com um poema que aprendi recentemente e que acho que vão adaptar ao tema.

Teoria do Psicodrama

Um Encontro de dois:
olhos nos olhos,
face a face.

E quando estiveres perto,
arrancar-te-ei os olhos e
colocá-los-ei no lugar dos meus;

E arrancarei meus olhos
para colocá-los no lugar dos teus;

Então ver-te-ei com os teus olhos
e tu ver-me-ás com os meus.

Jacob Levy Moreno
(18 de maio de 1889 - 14 de maio de 1974), foi um médico, psicólogo, filósofo, dramaturgo turco-judeu nascido na Roménia, crescido na Áustria (Viena) e naturalizado americano criador do psicodrama e pioneiro no estudo da terapia em grupo.

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