Eugénia, Chefe de um Grupo composto por Homens


Tereza Lamy

Apresento-vos hoje uma Mulher ainda quase Menina de 26 anos, Poderosa. 

Mas para contar a sua história, tenho de mostrar como a conheci. É isto:

Eles chegam com os seus enormes bombos e a sua presença destaca-se no meio de todas as cores e animação das festas onde vão. São de Amarante, mas a sua presença é obrigatória há cerca de 50 anos no Carnaval de Torres Vedras. 

Começam a tocar e o coração do povo acelera.

A cadência do ritmo, a forma como os seus corpos fortes e masculinos se confundem com os tambores enormes levam-nos a um estado de encantamento que nos enraíza, nos conduz às nossas origens, como se soubéssemos que outrora pertencemos a sociedades tribais onde os tambores nos chamavam para a festa ou para a guerra. Aqui é a festa.



O ritmo, o som cada vez mais forte entra-nos no corpo, agarra-nos ao chão e bate ao som dos corações cada vez mais rápido. Há crianças e adultos que pulam no meio deles, um pouco a medo primeiro, depois sabendo que neste círculo mágico formado por estes músicos, se encontram protegidos por este som de encantamento, que esperámos um ano para sentir.

E no meio de todos estes Homens fortes e poderosos que conseguem tocar estes instrumentos que requerem não só ritmo, harmonia, composição musical, como também uma enorme resistência física, este ano, surge a Condutora do Grupo ou a Chefe do grupo como ela se denomina, encontra-se Eugénia, a sua Representante. 

Quem és tu Eugénia?

Eugénia é pequenina fisicamente, tem apenas 26 anos, e diz com uma voz de candura e doçura que contrasta com a força do som dos bombos, explicando-se “Eu cresci nisto, sem os bombos eu não era a mesma pessoa ”. E Sorri.

Eugénia estudou, fez curso Universitário, depois curso de Solicitadora, profissão que exerce actualmente. 

Mas os bombos, são a sua paixão. O grupo chama-se Santa Maria de Jazente de Amarante e foi fundado pelo seu avô em 1949, Abel Ribeiro. 

O seu avô apenas teve filhas mulheres  e uma delas, a mãe de Eugénia pegou na paixão do pai, aprendeu a tocar estes instrumentos de percussão que requerem grande força e que tradicionalmente estávamos habituados e ver serem tocados por homens, tornando-se  ela própria Chefe do Grupo. 

Esta paixão foi passada à filha, Eugénia. Só quem vê de perto as protecções que estes músicos usam nas mãos devido ao esforço que fazem para tocar com as baquetas nos grandes bombos entende a força que só pode vir de uma grande paixão interior de nos fazer vibrar de emoção.

O grupo é nacionalmente conhecido e chamado a tocar em festas por todo o pais, mas também no estrangeiro (França e Brasil) e outros locais onde há comunidades portuguesas que os solicitam.

A Mãe da Eugénia e ela própria criaram também um grupo feminino a pedido de muitas meninas e mulheres que queriam tocar estes instrumentos que nos encantam com  a capacidade de sons de que são capazes e não nos deixam esquecer as nossas tradições– Bombos; Caixas; Concertinas; Acordeões e gaitas de foles. 
São as “Rosas de Santa Maria de Amarante” que por vezes tocam em conjunto com os músicos do grupo masculino.

-“ Mas como é  Eugénia, seres a condutora, a Chefe de um grupo só de Homens, como estes que trazes contigo, todos mais fortes e alguns mais velhos que tu?

Eugénia sorri com seu ar de menina doce responde:

- “Sinto um enorme orgulho e emoção por continuar a tradição do meu avô e os Homens que tocam e conduzo são todos amigos, há respeito e camaradagem, sabem que têm de seguir o ritmo e a música é o mais importante. 

Quando tocamos não importa se sou Mulher, seguem as orientações da Chefe do Grupo, para que tudo saia bem e o povo goste da actuação."

- “E namorado Eugénia, como é?”

Grande sorriso desta menina mulher - “Ah, tenho namorado, faz parte do grupo, foi assim que começou”…e acata as minhas orientações como os outros... e como se costuma dizer, comigo, vai tudo a “toque de caixa”.

Acabámos as duas a rir, claro.

Foi assim que a conheci, vestida com a farda do grupo, calças pretas e camisa vermelha, cujo simbolismo anda não descobriu bem,  talvez tenha a ver com a guerra de antigamente, diz. 

Eu acho que tem a ver com a paixão com que toca e com que nos toca.
Bem fundo. Eu tenho orgulho em Mulheres como ela e vou sentir a falta do som do seu grupo. 

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